quarta-feira, 19 de março de 2014

Box 'Moraes Moreira anos 70' reúne quatro obras antológicas de Moraes

RELANÇAMENTO
Primeira fase de Moraes Moreira solo agora em CD
São discos que documentam a evolução da música do baiano
por José Teles


“Fiquei pirado com esta iniciativa. Quando botei as mãos na caxinha, foi como se manipulasse o tempo”. O comentário é de Moraes Moreira sobre a caixa lançada pela gravadora carioca Discobertas, com seus quatro primeiros discos solo, lançados entre 1975 e 1979: Moraes Moreira (1975), Cara e coração (1977), Alto falante (1978), e Lá vem o Brasil descendo a ladeira (1979), todos pela Som Livre, que continua ignorando solenemente grande parte do que editou na década de 70: “As gravadoras entraram em decadência, e não se dão atenção ao acervo que possuem, em preservar a memória da MPB. O que fazem é lançar coletâneas, que sucateiam a obra do artista. O rapaz da Discobertas, Marcelo (Fróes), lançou estes discos sem que eu procurasse, foi iniciativa própria”, desabafa.

São álbuns fundamentais no desenvolvimento da música de Moraes Moreira, que acompanham seu crescimento artístico individual, aos poucos livrando-se do coletivo Novos Baianos: “O primeiro disco tem duas parcerias minhas com Galvão, ainda tem muito dos Novos Baianos. Sou querendo buscar minha marca, o que só consegui no terceiro. Eu sentia todo o peso de deixar o grupo, que foi como abandonar uma religião. O disco não foi muito bem divulgado, não vendeu muito, nenhuma música fez sucesso, Mas virou cult. Marisa Monte ouvia bastante este disco, foi de Chuva no brejo, uma das faixas dele, que ela tirou os versos Barulhinho bom, que batizou seu disco”.

Moraes Moreira soa muito mais “Novos Baianos, do que o disco que a banda gravava na época, o também ótimo, Caia na estrada e perigas ver (1976). Os músicos que tocam com ele são praticamente os mesmo que tocavam com os NB: Armandinho Macedo (guitarra baiana, bandolim, craviola, guitarra), Dadi Carvalho (baixo), Mu Carvalho (piano), Gustavo Schroeder (bateria): “Mu, irmão de Dadi, começou a carreira profissional neste disco, Gustavo já tocava antes em grupos de rock, os outros tocavam com a gente nos Novos Baianos. Um empresário viu os caras tocando comigo. Ele fizeram muito sucesso como a Cor do Som”, conta Moraes Moreira.

Cara & coração já recebeu mais atenção da gravadora, tocou bem no rádio. A marca Novos Baianos ainda existe na música e sonoridade do artista, mas é menos nítida. O disco traz um dos maiores sucessos de 1978, Pombo correio, que passou a ser obrigatória em bailes carnavalescos, foi tema de novela, e de programas da TV Globo: “A música era do repertório do trio elétrico de Dodô e Osmar. Quando comecei a conviver com eles, aprendi a música, feita em 1952, e botei letra em 1974. Mas outras faixas também fizeram sucesso, como O que é... o que é, às 3 da manhã, d Herivelto Martins, uma das músicas que João Gilberto me ensinou”. O samba tirado do baú de prata de João, foi lançado por Aracy de Almeida, em 1946.

De Cara e coração tem resquícios do udigrudi dos 70. A faixa Meiufiu, por exemplo, é um poema de Chacal ( o carioca Ricardo de Carvalho), publicado originalmente na edição brasileira do jornal Rolling Stone, em 1972, que Moraes Moreira conta ter conhecido num livro do poeta. Já Davilicença foi integrada ao repertório de Nara Leão, em seu retorno aos palcos, depois de quatro anos afastada, em 1978, no Projeto Pixinguinha dividido com Dominguinhos.

TRANSIÇÃO

“ É meu primeiro disco mais ex-Novos baianos. Já estava mais seguro, foi quando abri para os parceiros, tem várias parcerias com Fausto Nilo, um disco que tocou muito no rádio. Era um tempo em que emissoras eram mais democráticas. Tinha jabá, claro, que ele sempre existiu, mas se você chegasse com uma música forte o pessoal tocava”, diz Moraes Moreira de Alto falante, o terceiro disco solo, em que contou com ajuda de Pepeu Gomes e Armandinho Macedo.

Foi também uma fase de transição tecnológica, os estúdios modernizavam-se, tinha-se mais acesso a equipamentos de ponta. A produção de discos, no entanto, ainda engatinhava. O álbum de 1975, nem dá crédito a produtor, apenas aos arranjos, de Moraes e Armandinho. Nos outros três credita-se a Guto Graça Mello a “direção de produção”. Moraes Moreira revela que quem produzia os discos era ele mesmo, com os músicos que tocaram no disco: “Guto era então um empregado da Som Livre. Quem fazia os discos éramos eu, Pepeu, não tinha o produtor”.

Lá vem o Brasil descendo a ladeira é o álbum tecnicamente mais bem resolvido dos quatro. Foi gravado quando os estúdios brasileiros adentravam a maioridade. Foi igualmente o álbum que consolidou Moraes Moreira um superstar da MPB, para todas as tribos, com músicas pra cima, carnavalescas. Dele várias canções ficaram incorporadas ao seu repertório, a exemplo de Assim pintou Moçambique, os frevos Pelas capitais e O chão da praça (com Arrumadinho Macedo excedendo-se como músico), e Lá vem o Brasil descendo a ladeira, com Assis Valente, em que Moraes e Pepeu incorporam um Assis Valente. Tocam na faixa uma seleção de cobras criadas do instrumental: Márcio Montarroyos (trompete), Oswaldinho (acordeom), Ed Maciel (trombone), Marçal (percussão), Zé Bodega (sax tenor).

O quinto disco de Moraes Moreira saiu com selo da Ariola, gravadora alemã que entrou no Brasil como um arrasa quarteirão, que arrastou, a peso de ouro, os maiores nomes da MPB para seu elenco (ele voltaria à Som Livre, pela qual lançaria dois discos, no começo dos anos 90). Estes quatro CDs foram remasterizados, mas não lhes foram acrescentadas faixas extras. Reouvindo-os em CD, Moraes Moreira afirma que, além da remasterização, não mudaria nada em nenhum deles: “São o retrato de um tempo, com todo aquele meu entusiasmo. Estou neles com o meu natural, minha verdades. Foram feitos sem retoques, sem maquiagem”. Empregando uma expressão pernambucana: “na chincha”. No entanto, a caixa Moraes Moreira anos 70, mudou Moraes, o motivaram a levar esta música para a estrada. Numa turnê que provavelmente será intitulada Moraes Moreira solo 70.

Fonte : http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cultura/noticia/2014/03/17/primeira-fase-de-moraes-moreira-solo-agora-em-cd-121667.php


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